não me recordo de nenhuma obra que Ghandi tenha inaugurado. Mas me lembro bem de outros gestos seus. Como uma longa caminhada que fez rumo ao mar quando tinha 61 anos de idade. Mais de quatrocentos quilômetros, 24 dias, 18 quilômetros por dia. Para quê? A inglaterra, potência colonial dominadora, proibia que os indianos possuíssem qualquer sal que não lhes estivesse sido vendido pelo monopólio governamental inglês. Ghandi Resolveu caminhar até o mar para ali transgredir a vontade dos dominadores: tomar nas mãos o sal que o mar e o sol haviam depositado nas rochas. Gesto mínimo, fraco, que não seria marcado por nenhuma fita cortada nem por nenhuma placa de bronze. Há situações em que a quebra da lei é a única forma de ser íntegro. Bem que podia ter ido em lombo de animal ou em vagão de trem. Seria mais rápido, mais cômodo. os políticos que se prezam tem horror a lentidão. Por isso se concedem atributos divinos de onipresença: agora estão aqui mas num abrir e fechar de olhos estão ali. Voam pelos espaços para se fazer ver e inaugurar... Ghandi pensava diferente, sabia que a vida cresce devagar.
Não queria inaugurar coisa alguma. Queria gerar um povo. E isso leva tempo, como uma gravidez. Era preciso que a caminhada demorasse, para que as pessoas caminhassem com ele e, com ele, sonhassem. E enquanto ele ia, crescia, na alma do seu povo, o sonho...
[...]
Pensei então que há dois tipos de políticos:
- Os que se oferecem aos olhos do povo;
- e os que oferecem novos olhos ao povo.
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